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CYBER-CAPITALISMO e PSICOLOGIA


 

As novas formas de trabalho da sociedade contemporânea

Amanda C. Gontijo Silva


 

Quando paramos para pensar em trabalho um aspecto fundamental a ser levado em consideração é o significado, a etimologia da palavra trabalho e sua contextualização histórica. Pensando num ponto de vista que melhor se alinha à psicologia, a autora Sônia Viegas traz uma concepção ampla e bem fundamentada dos processos de trabalho e labor. Sônia Viegas retrata as concepções de trabalho recuperando significados construídos historicamente, que se dividem em dualidades negativas e positivas. Primeiramente, recapitula a influência religiosa, em especial do cristianismo, quanto à construção de significado de trabalho, sendo também fonte das versões negativas do sentido de trabalho e se fazendo ainda como pilar de sustentação ao modelo e concepção contemporânea de trabalho. Trabalho como é tido na sociedade contemporânea é visto como dispendioso, como uma forma de tortura, relacionado à subordinação. Porém, a autora recupera também as concepções Marxistas acerca de trabalho, principalmente no que tange o sentido e o significado de trabalho e de labor. A autora apresenta, a partir de Marx, uma versão de trabalho que dá importância ao processo e à construção de uma produção, e não ao produto final apenas — marco e falha ápice do sistema capital, que valoriza mais o produto final do que o processo de produção realizado e o esforço do trabalhador.



Desta forma, a autora expõe as marcas impressas pelo capitalismo na nossa sociedade, a medida que, alinhando e comparando tais concepções aos ideais propostos por Marx, realiza denúncia à corrupção desse sistema de exploração perversa da força de trabalho dos sujeitos sociais. As ideias propostas por Marx frente às denúncias ao capital servem também como ponto de apoio e combustível para a formação dos sindicatos, e os abastecem com ideais que reivindicam a igualdade, justiça, e direitos aos trabalhadores explorados pelo sistema capital. Apesar de os sindicatos terem papel fundamental na consolidação de direitos trabalhistas, existe uma ameaça iminente contra os sindicatos na sociedade contemporânea, que visa seu extermínio. Isso porque, principalmente no Brasil, com o sucateamento das políticas públicas e legislativas, que ocorre à medida que o neoliberalismo ascende, os sindicatos perdem força e são atacados. Além disso, as artimanhas e artifícios oriundos do sistema capital neoliberal, como a uberização e virtualização do trabalho, apenas contribuem para a fragmentação dos trabalhadores como classe, fomentando um pensamento e comportamento individualizantes e segregantes.


Essas mudanças de mercado e as consequentes mudanças políticas aparecem como forma de criar uma sustentação para o sistema capitalista que sempre esteve em ameaça de colapso, tanto pela finitude dos recursos que consome, quanto pelo adoecimento e exaurir da força de trabalho dos trabalhadores, o capitalismo impõe sua própria finitude. O liberalismo e o neoliberalismo surgem como formas de dar sustentação ao sistema capital, e daí os diversos artifícios de manutenção deste, como a uberização, pejotização, etc. que são, além de estratégias de mercado, atitudes políticas que facilitam a perpetuação da classe dominante exploratória, como, por exemplo, o sucateamento da CLT no governo Temer, que afrouxou a legislação trabalhista de forma a propiciar maior exploração dos trabalhadores em prol do benefício dos empregadores. É importante ressaltar ainda, que a faceta política que promove e facilita a perda de direitos trabalhistas não é acidental nem coincidente, mas porque a dominação política, principalmente em países em desenvolvimento como no Brasil, é de pertencimento à uma classe elitista, dominante, que possui cor, gênero e status social, e que age de forma a perpetuar seus interesses.



A uberização surge juntamente com o avanço das tecnologias da informação e da virtualização, marcas do mundo contemporâneo que aprecio denominar de “cyber-capitalismo”. No cyber-capitalismo, a uberização e a gamificação, a fragmentação das relações de trabalho e os pressupostos individualistas, marcas do neoliberalismo, se expandem e se potencializam. Isso ocorre a partir da necessidade, como com a pandemia, mas alguns estudos demonstram que isso já vinha acontecendo e, a partir do avanço das tecnologias e da automatização dos meios de trabalho, a tendência é que esta realidade prevaleça. As formas de comunicação, interação e contato se virtualizam, assim como as relações de trabalho e as relações interpessoais. A virtualização das relações tende à uma maior individualização, para sujeitos mais autocentrados e “empreendedores” de si, desmoralizando o sentimento de pertencimento à classe trabalhadora e alimentando as alegorias capitais contemporâneas.


Pensando nas ideias apresentadas, e pensando também na fragmentação de grupos e classes que, perdidas no abismo cibernético se polarizam cada vez mais, é importante lembrar que os meios digitais e virtuais fazem dos sujeitos vítimas ainda maiores da manipulação perversa de grupos dominantes normativos que detém esse meio, como pode ser observado no material construído por Bruno Cardoso, que discorre acerca das tecno políticas de vigilância. Analisando todo este contexto, é preciso pensar na psicologia de forma crítica, alimentando as possibilidades de intervenções críticas frente às instituições, na perspectiva de libertação. A formação e perpetuação da pesquisa e análise crítica das instituições, assim como uma visão mais social, histórica e cultural que visa superar as barreiras individualizantes que a clínica muitas vezes carrega. É importante atentar ainda para a inclusão de perspectivas como da clínica do trabalho e da saúde do trabalhador como pontos essenciais. Além disso, é preciso também se atentar para a atuação política que o profissional da psicologia possui, principalmente como concomitante à defesa dos direitos humanos. Uma visão crítica e social, que vai de contramão a aspectos dominantes e psicologizantes é essencial para uma práxis que visa a saúde coletiva e dos trabalhadores, a defesa de direitos humanos e a libertação.


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